
Quando ser “bonzinho ou boazinha” o tempo todo nos enfraquece.
- Natalia Fioravante
- 24 de out. de 2022
- 5 min de leitura
Atualizado: 31 de out. de 2022

Tenho certeza que você já se pegou em uma situação que gostaria de ter dito não, mas não conseguiu. Que em algum momento gostaria de ter expressado algo que você sabe que não iria ser aceito pelas pessoas a sua volta, então guardou para si mesmo se convencendo que não era tão importante assim o que ia dizer e acabou concordando com a maioria.
Você acabou fazendo algo que não desejava e desse modo acabou em uma situação que não tinha nada a ver com você, tudo para não desagradar ou lidar com a sensação de talvez não ser aceito. Saiba que você não está sozinho, em algum momento da vida todos nós de alguma forma acabamos aceitando, fazendo ou concordando com algo que não queríamos , talvez devido a circunstâncias, ou talvez você pode ter se encontrado em um momento que sente que fugiu do seu controle e concordar com tudo parece mais fácil, e te digo que vez ou outra temos mesmo que fazer coisas que nem sempre desejaríamos fazer, faz parte da vida. A grande questão é que fazer isso o tempo todo em prol de passar uma boa imagem “de bonzinho ou boazinha” ou de agradar sempre não é nada legal pra si mesmo e vou explicar porque.
Consigo entender o receio que se pode ter de receber críticas ou ser julgado pelo que se é, fala ou faz, ninguém quer ser julgado, todos queremos pertencer a algo, algum grupo, seja familiar, de trabalho ou amigos, mais saiba que se queremos ser autênticos e verdadeiros conosco mesmos temos que abrir mão de alguma coisa, e uma delas é de não agradar a todo instante, por vezes corremos o risco até de sermos incompreendidos em nossas decisões e atitudes e essa não é uma sensação muito boa.
Ser verdadeiro com a gente mesmo não deixa de ser um risco, porque nossa verdade pode muito bem ser diferente de um padrão estabelecido e isso pode gerar bastante medo e desconforto, mas o que você tem que ter em mente é que desagradar o outro também faz parte da vida, se torna pesado demais alguém carregar o fardo de ser bom demais para o outro o tempo todo.
Sabe quando somos crianças e queremos a aprovação dos nossos pais? Pois bem, queremos ser amados pelo que somos e receber a atenção deles pelo que fazemos, e isso de certa forma faz parte do desenvolvimento de uma criança, sentir que é querido lhe dá segurança pra continuar com seu processo de crescimento. Mas o tempo passou e você é um adulto agora, não necessita da aprovação contínua dos adultos como necessitava quando era uma menina ou um menino. Ou será que isso ainda está acontecendo por aí, às vezes até de forma inconsciente? Talvez deixar de lado essa criança que quer aprovação a custo de si mesmo seja dolorido porque isso pode fazer parte de um processo de individuação, ou seja de uma certa separação que temos que fazer dos nossos pais em dado momento de nosso processo de maturação e crescimento pra sermos nós mesmos no mundo, assim meio imperfeitos, com dúvidas, sem muita garantia de como é “caminhar com as nossas próprias pernas,” há um certo temor de não sermos aprovados, e não há nada errado nisso até certo ponto.
Agora quando abrimos mão do que somos e do que é importante pra nós pra sermos o “bonzinho ou a boazinha” acabamos nos machucando e nos enfraquecendo.
Razões pode ter várias para se agir desse modo e nem é minha intenção colocar todas elas nesse texto, afinal cada indivíduo é único e não há regras quando se trata da história de cada um, no entanto posso colocar aqui alguns pontos de reflexão.
• Pode existir uma dependência emocional que você não tem consciência, você pode achar que “caminhar com as próprias pernas” é muito desafiador, gerador de angústia, então precisa do outro o tempo todo para se firmar na vida, pra se sentir seguro ou segura.
• Pode ser também que por conta disso você se tornou um controlador, não desagradando o outro você tem certeza que o afeto e atenção estão sempre garantidos pra você, sim existe uma ideia de controle nisso também, há um ganho de sua parte em ser “bonzinho”.
• Ou ainda o seu ego, aquela instância no seu psiquismo responsável por ser o regulador de sua presença na vida, acaba cobrando de você desempenhos adequados, e que você não deveria ser assim tão quem se é, te fazendo acreditar que nunca se pode errar e se atrapalhar algumas vezes.
• As mulheres podem sentir mais dificuldade do que os homens porque foram ensinadas que devem ajudar, ser “boazinhas”, se enquadrar em um papel de “mulher de valor”, sendo sempre amorosas e cuidadoras.
Essas pequenas reflexões que coloco aqui são apenas pra te convidar a parar pra pensar se dá pra ser “bom ” a qualquer custo, inclusive custando muito de si mesmo.
Se enfraquece quando não se valida a própria verdade, você pode até ganhar a aprovação alheia, mas você perde de um lado, que é sua forma mais autêntica de ser no mundo.
É claro que não é extremamente errado querer ser agradável e aceito, mas tem uma medida, que é aquela de não se anular ou esquecer de si, só pra responder ao que você acredita que esperam de você. Não é pesado isso?
Perguntas como o que ganho não desagradando o outro ou o que espero da outra pessoa em troca importa nessa hora, mas além do que já mencionei aqui, pode existir outros fatores pra você se colocar nesse lugar com frequência e só uma terapia pode te levar a se a aprofundar mais, pois cada pessoa é única e sua história também.
Sei que é um tema complexo e que não se esgota tão fácil porque mexe com uma questão meio polêmica na nossa sociedade, que é a ideia ou crença que pensar em si mesmo faz parecer que os outros não tem importância, e aprendemos que isso deve ser evitado, que somos “egoístas” em nos colocar em um lugar onde validamos o nosso desejo. Veja que aqui também entra em jogo uma certa desconstrução do que aprendemos sobre levar nossas necessidades além das necessidades de outras pessoas em consideração, e em estabelecer seus próprios limites quando necessário.
O processo de individuação leva tempo e cada um tem o seu, não é sempre simples tomar a sua verdade pra si e sustentá- la, mas se pode começar aos poucos, com pequenas decisões, como dizer que não quer ir a algum lugar quando não se tem vontade de ir, ao invés de ceder porque não quer ser “chato”, com o tempo pode ir ficando menos complexo, mas na sociedade em que vivemos em que ser padrão é bonito, quem se diferencia por pensar ou sentir diferente da maioria acaba gerando algum desconforto.
E é nessa hora que você ganha sustentando o que deseja em um exercício diário de compromisso consigo mesmo, se fortalecendo na auto-estima que vai adquirindo nesse processo, às vezes não é fácil, mas pode valer muito a pena.
*arte Helena Pérez Garcia
Comments